O ano não mais recordo-me. Acho que por volta de 1960 a 1962,
em Itiúba tinha um médico chamado carinhosamente “Drº Manoel”, um sujeito todo
bondade que, formado na capital escolheu a cidade de Itiúba para clinicar.
Era ele uma
mistura de todas as especialidades. Parece ter sido talhado para ser médicos
nos sertões carentes e tão necessitados.
Bonachão e
simplório, cheio de amigos e camaradagens, o doutor gostava de uma branquinha
que sorvia como se fosse o último gole da vida, o que não lhe tirava os méritos
do reconhecimento de ser, quanto mais alto,
um excelente médico.
Aplicava
injeção, visitava enfermos em suas casas e, praticamente não cobrava dos
pacientes. Era um caridoso, um mão aberta,
um sujeito porreta, mas explorado evidentemente.
Durante as
festas juninas, costumava recepcionar em sua casa muitas pessoas que ficavam
sentadas à porta, enquanto bebericavam, segundo o costume local e da época fartos
goles de puro licor de jenipapo.
Costumava
acender a sua fogueira e se jactanciava de que “ninguém comeria sua fogueira
crua”, o que na época significava que ninguém derrubaria antes do fogo
consumir todo o caule e madeira, quando a turma avançava em disputa alegre e
feliz ,os frutos e até o segredo que era uma prenda de maior valor.
Municiava-se
de espadas que nada mais eram do que busca-pés, fogos letais e que exigem
perícia de quem os queima. Numa dessas festas, meu pai Joaquim Brandão que
ainda era relativamente jovem, fora convidado com sua “turma” que era eu o
Mario (falecido), e o Aloísio um moço praticamente criado em nossa casa, para
que fôssemos fazer uma guerra de
espadas.
Papai costumava
gastar uma fortuna tocando e queimando dinheiro em espadas e outros fogos, mas
não atirávamos nas pessoas, e sim, íamos quando convidados, tal o nosso caso,
em que papai nos comunicou o desafio do doutor para a guerra de fogos, porém
com regras. Cavalheiros existiam e fomos. Na noite fizemos uma bela festa até
antes de a fogueira vir a baixo. Jogávamos espadas para lá enquanto o doutor
Manoel mandava as suas contra nós que ficávamos na ponta da balaustrada da
estrada de ferro. No dia seguinte ele falava conosco, nos tratando por
“Brandãozinho”, diminutivo do nosso sobrenome Brandão, carinhosamente, enquanto relatava as coisas entre sorrisos. Uma bela e
inolvidável e inesquecível festa, em que preservávamos pessoas e bens.
Dia seguinte
seria o dia da fogueira de “Mãe Teodora”. Eu rapazinho afoito nos meus 13 a 14
anos, rumei para lá cheio de pequenas espadas, sobra do dia anterior, aonde
iria, certamente me mostrar antes da queima da fogueira já que era supremo
pecado queimar espadas na fogueira de Mãe Teodora que vinha a ser a parteira da
cidade, que inclusive fez todos os partos da minha mãe.
Cheio de
orgulho e cercado de pivetes, acendi uma espada, e, ao voltear sobre o corpo e
aprontar para fazer o lançamento, a espada estourou na minha mão. Cheio de
dores terríveis e lancinantes, mito de desapontamento e humilhado, pedi socorro
a uma pessoa que e conduziu-me de bicicleta ate a minha casa, naturalmente
disfarçando dor e estrago na mão direita que por pouco não a perdi.
Estoicamente
suportei às escondidas a dor imensa e, só após sair toda a família desabei no
sofá e pedi socorro à velha e querida Senhora, assim era o seu nome, nossa
auxiliar domiciliar.
Dia seguinte a
mão cheia de pomadas denunciaria, para desespero dos meus pais, o queimador de espadas. Papai não mais
tocou espadas. Só o Mario continuou não sei até quando. Aprendi a lição. Velhão
que sou hoje, com os sinais bastante apagados na mão direitas, ainda visíveis,
as cicatrizes que relembram o feito, pois que renunciei a toda forma de tocar
fogos.
Mais que era
bonito, lá isso era!!!
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