O que você quer saber sobre História?
Este blog tem como objetivo discutir História, postar artigos, discutir assuntos da atualidade, falar do que ninguém quer ouvir. Então sintam-se a vontade para perguntar, comentar, questionar alguma informação. Este é um espaço livre para quem gosta de fazer História.
quarta-feira, 28 de setembro de 2016
TIA MARICOTA E TONTONHO.
Assim chamávamos o casal de velhinhos que morava junto à nossa casa.
Acostumados ao respeito e ao acolhimento, os meninos do meu tempo
costumavam chamar as pessoas amigas e vizinhas de “tios e tias”. Então, Tia
Maricota era aquela velhinha bondosa e delicada sempre mascando um
pedaço de fumo de corda e a soltar suas cusparadas longas. Tontonho que
suponho fosse “tio Antonio” era um estafeta dos Correios, cabelos
completamente esbranquiçados pelo tempo a fungar continuadamente.
Era uma família numerosa, todos os amigos e de idades diferentes, alguns
muito mais velhos. Mas nos dávamos muito bem. Para lá íamos eu e o Mario,
meu irmão, após o almoço, para fumar as escondidas na casa de Tia Maricota
que, cúmplice inveterada, não nos entregava aos nossos Paes.
Lá nos esparramávamos pelo chão da sala, sendo raras as cadeiras já
que o casal era muito pobre. Aquela casa exercia um fenômeno de atração
sobre nossas almas juvenis e ali aprendíamos muitas coisas, sobretudo o
respeito e o carinho, a doação e a delicadeza. Saíamos por volta das 15 horas
quando os velhos se retiravam para uma soneca, após o almoço. Nunca fomos
mandados embora. Aquele poço de delicadeza e bondade era incapaz de
ofender seja quem for.
Como o mundo dá suas voltas, não pude despedir-me dos dois na
passagem da janela do tempo quando se fechou para eles. Morava e estudava
distante, aliás, marca registrada da minha vida de não me despedir dos entes
queridos. Mas fica aqui o registro repetido daqueles amados velhinhos da
minha mocidade com o meu preito de gratidão.
domingo, 4 de setembro de 2016
DILMA, O POSTE.
Creio que meus netos, daqui a uns
cinquenta anos, se perguntarão: o que nosso avô quis dizer, quando chamou essa
senhora, de “Dilma, o poste?Creio
que pensarão , ajudados pelos seus pais; meus filhos, e ,consequentemente pais
dos rebentos, que o avô era um dos exóticos intelectuais que viveram no passado. Talvez , de algum modo , quando não estiverem caçando pokémons, se debrucem sobre o
instrumental que a ciência joga no mundo nos dias, e, dentro desse instrumental
maravilhoso que é a ciencia, desvendem o que aconteceu, um dia, quando a juventude
do tempo do avô era quase ou totalmente absorta, pobre de raciocínios, incapaz
de pensar e de ler uma pobre e insignificante linha de um livro.
Talvez, meus netos, conversando com seus pais,
ouçam que o “velho” era dono de uma alentada biblioteca e que, seu avô mesmo no
seu tempo,era um “velhinho” doido por livros e jornais que lia com sofreguidão
e com muita fome de saber e aprender.
Os meus netos possivelmente não
aceitarão essa coisa e começarão a interrogar como se estivessem diante das
antigas penitenciarias o que significava “ler”.
Meus filhos certamente procurarão
explicar aos seus filhos, meus “netinhos
discaradinhos” que o “vô, mesmo no seu tempo, já era um velhinho que
“ainda” gostava de ler livros, e o cara,
se deliciava com o que lia, embora um
cara que vinha de dois séculos.
Não devemos esquecer-nos de informar
que o miserável e desacreditado vô era um cara perdido no tempo e no espaço, e que,
não tinha como falar com a juventude, porque existiam coisas como “whats aap”e que, nem mesmo os namorados,
esposas e familiares se comunicavam mais, salvo se estivessem em
perigo de vida.
Os meus netinhos vão dizer e se
espantar o quanto o avô era um bicho do mato, um “desplugado”, um “desantenado”
da vida, e, como o velhinho do seu pai era um ultrapassado, que escrevia poesias;
sonhava, declamava versos e conversava aquela conversa de pé de ouvido às
amadas, fazia serenatas e declamava versos à mulherada, se debruçava em amor e
conseguia amar.
Espero que você diga que o curso da
ciencia e do conhecimento é inexorável, mas que, seu pai, portanto avô dos
pobres e desarvorados e sem objetivos dos meus netos, era um intelectual, que
lia, deglutia e amava os livros que existiam no nosso tempo.
Enquanto isso, seus filhos estarão
voando e navegando pelas galáxias da insensatez.
O resto é só a mais pura tolice de um velhinho
ultrapassado, assustado com a imbecilidade do mundo que ele, na sua ignorância,
pensa.
Salvo, se caçar pokémons, e conversar
com a namorada na mesma mesa através de telefones, sejam a forma correta e
romântica.
Se não for, então que me perdoem meus
netinhos a terrível e crônica ignorância desse avô desgraçado e desnaturado que
fala mal da juventude!!!.
sexta-feira, 26 de agosto de 2016
SOBRE GENGIBIRRA E REFRESCO DE MORANGO
.
Minha infância foi assim mesmo. Nada
de refrigerante, salvo um único, aos domingos, quando saia a passeio com meu
pai. Nos sertões de Itiúba, interiorzão da Bahia dos meus idos tempos, quando
ainda não existia essa coisa modernosa de “fast food”, “praças de alimentação”,
“shoppings centers” o escambau.
Deixou-me a marca indelével que
permanece soberana. Detesto morangos. Não combino com o sabor, poucas vezes
compro-os, salvo para agradar à minha esposa. Detesto morangos e, a razão, é
simples: no Bar do Zé Dantas bebíamos a doer às têmporas, de tão gelado, em
preços que podíamos pagar copos e mais copos daquela beberagem de cor vermelho
vivo, incorpado e incorporado aos sabores da minha geração.
A sisudez do Zé Dantas, charutão na
boca e não tão bem humorado, “menino só
entrava para comprar, pagar e sair”,
entre resmungos, que o homem não era lá de muita conversa, em especial com
garotos.
Já procurei por esse mundão a tal da “essência” com a qual o Zé Dantas
preparava aquele “manjar”, e jamais consegui descobrir ou encontrá-la. Eis a
razão pela qual meu paladar ficou viciado com aquele sabor maravilhoso a ponto
de não conseguir digerir a fruta morango nem jamais consegui fazer, sequer, um
licor com aquele sabor.
Outra iguaria tratava-se da tal da gengibirra, uma beberagem vendida ao
natural, em copos “faz- de- contas- que-
lavados”, acomodado num barril de madeira que era trazido pelo seu
proprietário e vendedor, lá dos lados da Rua da Estação, tendo armado, sobre o
tonel, um guarda chuva preto e sebento
de tanto uso, sendo estacionário entre a Loja do senhor Augusto Moura e a
farmácia do senhor Soares, ambos já despedidos deste mundo.
O tempo se encarregou de apagar,
tanto os vendedores, quanto os consumidores. Coisas simples “que desaparecem e
ninguém mais se recorda, salvo os” meninos-velhos” ou “velhos-meninos” perdidos
no tempo e no espaço a remoer tempos idos que jamais voltarão.
segunda-feira, 15 de agosto de 2016
CATEDRAIS
O mundo todo sabe o significado de “catedrais”. Em especial na Idade Média quando os chamados próceres do catolicismo na sua megalomania, construíram, ainda que quebrando nações sob seu infame domínio, quando não, países inteiros.
Obrigavam vassalos a ficarem despossuídos dos seus patrimônios com promessas mirabolantes de encontrarem um pedaço no céu, ao seu dispor, depois, e, quando partissem dessa para o além. Foram construídas catedrais imensas e portentosas, algumas, sobreviveram às destiorações e às intempéries, desafiando o espaço e a calamidade que se abate, pela natureza zangada, ou, pela simples passagem inexorável do tempo.
Mas não são aqueles ricos e faustosos monumentos que nos referimos. Refiro-me mesmo às catedrais construídas por nós, para nosso deleite, e, ao mesmo tempo desconforto de terceiros, daquelas que o tempo se encarrega de apagar todos os vestígios e de fazer esquecidos construtores, arquitetos tolos.
Construímos para nossa vã filosofia catedrais enormes, nos perdemos em emaranhados tapumes, desvendamos quartos e dependências recônditas e nos escondemos na célula mais ínfima como se escudados na incerteza das nossas próprias construções, e nos perdemos e descemos até o mais escuro e desconhecido labirinto, a ponto de precisarmos de meadas para dali nos safarmos.
Por momentos embasbacados nos aprumamos nas nossas vãs existências, corriqueiras, rápidas e silenciosas, no descampado da realidade da passagem rápida e porque não dizer, até brusca, tal ou qual a chama de uma vela batida pelo vento, ou o distanciar de um navio do seu porto de partida desaparecendo na curvatura dos oceanos.
Em tudo nos perdemos nesse lamentoso e choroso momento em que teremos de deixar incólume, e, em abandono as catedrais construídas , a perenidade daquele que há por vir. O sagrado escritor já dizia: “Lembra-te homem que és pó, e em pó te hás de transformar”. Não obstante continuamos lavorando nas nossas construções, nos cercando de muros e minaretes, nos distanciando da existência e da abertura das almas e nos aprofundamos nas nossas incoerências, esvaindo-nos em esforços vãos que não nos levam a caminho algum, quando muito, encurta os passos para a morada dos mortais.
Deixamos para trás simples e pobres intrincados de construções ricas e mirabolantes, portentosas e suntuosas no desvario das nossas
concepções e das nossas fatuidades existencialistas, em nome e em benefício das nossas pobres, tristes e vaidades passageiras.
quarta-feira, 3 de agosto de 2016
UM CRENTE CHAMADO LINO
Conheci o meu dileto e desaparecido
amigo e Irmão Lino, em dois
momentos distintos. O primeiro, quando eu era criança nas aulas de catecismo na
paróquia Local, quando nas tardes de domingo o velho pároco ladino e
espiritualmente equivocado nos ensinavam a nutrir ódio pelos “protestantes”,
“pelos bodes”, “pelos capas-pretas”, “pelos inimigos da virgem Maria” com as
recomendações para que nós disséssemos ao padre, no domingo seguinte, “se papai
e mamãe tinham recebido em algum
protestante capa preta”.
Passei a conhecer Irmão Lino e evitava
aproximar-me do seu filho de nome João e, outros que a mente já não se recorda,
como sendo “filhos do homem inimigo da igreja católica”.
No segundo momento, conheci-o no ano de 1968 e 1969 quando cheguei a
Itiúba transformado e lavado pelo Sangue
de Jesus Cristo e me dispus a fazer e a realizar a obra da pregação e da
salvação dos perdidos e desesperançados, para desespero dos meus pais que viam
com imensa tristeza seu filho “protestante”.
Jamais em toda a minha existência
conheci um homem de profundo amor e desprendimento pelos perdidos. Viajávamos
para lugarejos os mais distantes, em longas e cansativas caminhadas, cuja finalidade
era a de levar o Evangelho aos perdidos. Ganhamos desse modo, muitas almas para
Cristo. Humilde e conhecedor das escrituras,
Irmão Lino criou por mim uma amizade profunda e eterna dessas que nem a
morte consegue apagar nem fazer desaparecer pela ausencia.
Ele possuía oitenta anos. No ano de
1968 salvo engano, o homem conseguiu ganhar uma jovem tornando-a sua esposa,
acho que pela quarta vez casado daí nascendo uma garota hoje, já uma mulher
madura, e que, faz parte da nossa Igreja
Batista.
Eu tinha em 1969 a idade entre 22 ou
23 anos, portanto no melhor do meu rompante juvenil. As dificuldades em
acompanhar as longas passadas daquele gigante
Lino pelas estradas poeirentas eram imensas. Muitas vezes tive de
trotar para poder acompanhá-lo, o que disfarçava para não dar o braço a torcer.
Coisas da vida.
Não nos despedidos. Em 1969 fui para o
Rio de Janeiro completar meus estudos no Seminário Teológico Batista do Sul do
Brasil e, nunca mais nos vimos. Arrebatado deste plano, não pudemos nos
despedir nem eu fazer aquela prédica que sei, ele gostaria.
Essa minha homenagem ao Irmão Lino é eterna. Tenho dito
aos meus amigos mais chegados que, quando no Céu chegar, entre todos seremos os
primeiros a nos abraçar. Irmão Lino
foi um gigante na fé que na sua humildade e paixão pelas almas perdidas não se
poupou de levar a mensagem nos lugares mais difíceis.
quinta-feira, 21 de julho de 2016
“CANTU”
Assim mesmo. Simples como a simplicidade em si. Alguém poderá até
acrescentar que o correto seria “Kantu”. Não sei; não sabemos. Mas todos
sabem que se tratou de uma dessas criaturas simples, gente do povo, talvez
sem aderências afetivas ou sociais, que passou resvalando por esse vidão que
o Deus nos dá.
Dona Cantu foi uma velhinha de pernas frágeis, sequinha e de olhos
envidraçados por alguma malvada catarata do abandono da velhice e da
dureza padecente em que vivia.
Morava na Praça Nova, numa casa velha destiorada pelo tempo, lavada
pelas muitas chuvas e batida pelos muitos sóis dos sertões. Na frente, existia
frondoso e alvissareiro tamarindeiro a desafiar pedradas e garotos ávidos.
Descubro-me o quanto éramos os garotos daqueles tempos, cavalheiros.
Nunca negávamos o pronome de tratamento “dona” ou “senhora”, pelo que a
condição de pobre criatura e desafortunada da vida Cantu não autorizou,
jamais, menino do meu tempo a lhe pespegar um “Cantu” desrespeitoso sem
as devidas mesinhas do trato com intimidade.
Não lhe sabemos a origem. Apenas que era uma frágil criatura que vivia
com, ao que parece, uma das suas irmãs ou parentas, ajudava a entregar leite
que era vendido de porta em porta, enfim, uma simples “menina de recado”.
Andava com regulares dificuldades, talvez pela artrose que não poupa os
velhos, mas de uma lucidez à prova, capaz de ter e contar com simpáticas
pessoas que a respeitavam entre elas Dona Maria Cesar, vetusta e rígida mãe
do escriba denunciador que exigia respeito pela “Cantu” e que não admitia que
os filhos apelidassem a Cantu, que ficava fula e raivosa a cuspir impropérios
contra os seus “detratores”, sem contar e relembrar que ela fora aquela que
levava leite todos os dias para os filhos.
Às vezes na calada da fria madrugada, penso e matuto: e se os meninos
daqueles tempos recebessem hoje os apelidos que dávamos nos velhos
daqueles tempos? Deixa pra lá.
Por lembrança de Tânea Gouveia, conterrânea, que ontem fez referencia
ao nome da Cantu, chegou-me a lembrança, uma vez que já escrevi aqui neste
blog sobre outros populares como Queixinho, Vicente e tantos não menos
populares, nas recordações que os velhos, meninos do ontem distante, nem de
longe poderiam pensar que nas brumas do passado enterramos as
recordações.
Obrigado, Cantu!
Até logo, Cantu!
domingo, 17 de julho de 2016
UM CEMITÉRIO BUCÓLICO.
A década era a de 1950. O catolicismo
espalhava suas garras distribuindo terror e crueldade, intolerância e ódio,
descrença e paganismo, sentindo-se ameaçado pelo avanço paulatino dos “protestantes”, no Brasil e no mundo,
pregando e ensinando sua crença num Único
e Poderoso Deus e Senhor Jesus Cristo,
enquanto este avançava a duras penas, pelo denodo e amor pelas almas que os “crentes” espalhavam nas cidades.
O catolicismo que foi “oficializado” pela monarquia no Brasil,
se estabelecera com todos os seus vícios e defeitos tão inerentes, espalhando
suas doutrinas ultra montanas, deixando sempre e sempre um rastro de sangue,
dor e corrupção nos países do seu
domínio católico.
A
duras penas o Brasil atravessa quase todo o período monárquico sem conseguir ao
menos arrefecer o ardor dos seus bispos e cardeais sempre empenhados em dominar
as instituições no Brasil e no mundo católico, afundando suas garras
dominadoras e opressoras sobre o mundo, ao bel prazer dos seus próceres, na
doutrina papista, e na ignorância dos governantes brasileiros.
Quando chegam os ventos liberalizantes
da Reforma Protestante entre nós, o
jesuitismo que dominava a pátria brasileira não arrefece da sua sanha
criminosa, perseguindo e matando impiedosamente todos quantos ousassem se levantar
contra as doutrinas católicas, apoiadas por príncipes e acólitos do
catolicismo na mais total e crassa
ignorância de direitos que em outras nações já vigiam com a chegada e avanço do
“protestantismo”, perdurando, entre
nós, a indecência e a imoralidade católica, no distorcer da bíblia e no modo
civilizado de convivência religiosa.
Por volta de 1822 com a chamada
independência do Brasil, já eram contados muitos protestantes no Brasil, porém
contando com uma igreja católica oficial em que seus religiosos recebiam
salários do Brasil uma vez que eram considerados padres e freiras e demais
religiosos católicos como funcionários do governo.
Com a proclamação republicana, ao
contrário do que deveria ser, a igreja
católica não perderia sua influência, muito pelo contrário, passaria a
contar com cardeais muito mais aguerridos em destruir as leis, seja condenando
o casamento civil e as instituições advindas com o Código Civil que viria a ser
a lei civil de todos os brasileiros, quer condenando o casamento civil quer
pregando e autoafirmando casamento eclesiástico, assim como ensinando e
amaldiçoando perante populações sem instrução propugnada pelos males da república
e sua nocividade, isso tudo em luta aberta contra a proclamação republicana, e
a nocividade dos credos que se estabeleciam na república.
Não obstante a declaração
republicana, o catolicismo continuou a permear a vida brasileira e a se aprofundar
em perseguições, as mais vis, causando não apenas dissensão, mas promovendo
abertamente as mais sórdidas campanhas contra os protestantes, negando-lhes o
direito de sepultamento nos eremitérios municipais, já que eram administrados
pelas paróquias brasileiras.
Assim nascem os “cemitérios de crentes”, uma tentativa de sepultar os crentes sem os
percalços desabonadores infligidos por católicos e padres açoitados por bispos
e cardeais, ali sendo depositados seus entes que abraçaram o protestantismo,
mas resinados com as perseguições até para depois da morte, cuja mancha será
carregada e denunciada de século a século.
Não existiu uma só cidade que não
tivesse seus cemitérios de crentes
Em Itiúba existiu o seu “cemitério de crentes”, afastado da
cidade, distante dos “católicos” para que sua influencia e temor se espalhasse
na negação da dignidade negada pela igreja da maioria, na descrença dos seus
pares, e fiéis, e na imensa e inaudita satisfação dos seus lideres embatinados
representado por cardeis e padres.
O cemitério era de pequenas dimensões.
Simplório como simplória foi a fé dos seus mortos, ostentava uma pequena porta
singela e batida pelos sóis e pelas chuvas, paredes caiadas de branco no torpor
da orada aos pés da montanha testemunha muda da crueldade da igreja que se
dizia de Cristo, mas que foi apossada por lobos vorazes corrompendo-a até a
medula.
Ali na placidez das montanhas de Itiúba
muitos corpos repousam nas covas rasas a espera da justiça que um dia virá, e
na satisfação dos corpos glorificados para a eternidade.
Justiça se faça aos jovens católicos de
Itiúba, entre eles um soteropolitano que num rasgo de revolta contra um padre
da localidade, que negou sepultamento a uma jovem católica que se suicidara, de
nome Joaquim Brandão Cirne entre outros.
No governo do senhor João Durval as
pedras dos alicerces do que restou do outrora
cemitério foram empurradas do seu lugar para dar passagem a uma estrada
de rodagem Itiúba-Camandaroba.
Que descansem em paz!
quinta-feira, 7 de julho de 2016
O HOMEM QUE NÃO TINHA NARIZ
O ano se não me recordo. Sei que foi na década de 70 quando eu já
estudava direito e fui aos sertões aproveitando um dos raros momentos de
descanso. Em lá chegando fui convidado por antigo colega de infância, hoje
falecido, então comprador e negociante de gado, para irmos à vizinha cidade
de Andorinha, a qual nunca lá havia estado antes.
Era um sábado.Movido pelo convite e pela curiosidade em conhecer a
pequena cidade, que por sinal achei-a muito simpática e organizada, fiquei
perambulando sozinho pelas ruas, já que abstêmio não frequentei os bares que
, ao que parece, os negócios do meu amigo, exigiam dele nos seus contactos.
Perambulando à toa cheguei a um lugar, ao que me parece,deposito de
animais de monta, onde se amarravam os animais, já que era dia de feira, e, ao
olhar casualmente para os lados, deparei-me com uma cena bizarra e
inusitada, passados mais de quarenta anos não me sai da cabeça.
Um homem com uma espécie de máscara abaixo dos olhos, um pano
solto, amarelecido e encardido, enfiava algum tipo de alimento na boca.
Lembrei-me que já o vira uma única vez, em dia de sábado, em Itiúba, minha
cidade natal, para nunca mais avistá-lo, salvo agora, em Andorinhas. O que vi
foi tétrico e pavoroso. O homem não possuía o lábio superior nem o nariz.
Recolhido e fugidio de púbico, aquele homem se recolhia escondido diante da
sua infelicidade, verdadeira monstruosidade a que não dera causa nem era
culpado, mas sabedor de que a humanidade não o aceitava. Jamais esqueci aquela cena pavorosa do ponto de vista da estética, pelo
que fiquei a ruminar o que levara aquele pobre e desafortunado homem ao
estado de tamanha miserabilidade física.
Bem verdade quando cheguei muito anos depois à cidade de Santo
Antonio de Jesus conheci e travei diálogo várias vezes com certo senhor que
exercia cargo na Embasa, despossuído de nariz, mas que a ciência
providenciara um, de cera, seguro pelos aros dos seus grossos óculos de grau,
imitando e tudo por tudo a sua cor e suas características, incapaz de cercar a
minha capacidade de vista, e de curiosidade mórbida, pelo que, ao falar ele ao
dele quem se aproximasse, podia-se ver de um lado ao outro na base de cera
que se apoiava sobre o rosto, o nariz saltitando quando ele emitia sons vocais!
Essa bizarrice humana e essa morbidez humana, não se têm
explicações, teima em permanecer no nosso consciente, a matutar e a refletir
causas e porquês de tais
sábado, 18 de junho de 2016
‘70’
Alcancei a marca. Bati na marca. Sim,
cheguei nesta data 18, aos setenta anos. No somatório, nada de novo. Todas as
experiências, todas as coisas por que passei, foram vividas no estuário comum
de qualquer mortal. Sim, cheguei aos setenta anos de vida.
Quando nasci de novo aos vinte anos,
aprendi na minha igreja Batista um hino em que se manda contar as bênçãos
alcançadas. Todas as vezes que olho para trás, conto graças. Formei minha
família, fiz filhos, plantei muitas, mas, muitas árvores mesmo, e, escrevi
livros, e vivi as experiências da vida.
Plantei muitas cruzes em cemitérios
distantes espalhados pelo Brasil imenso, ajudei a levar pessoas amigas,
conhecidas e desconhecidas aos cemitérios, e, lá ajudei a fincar cruzes
marcando o solo sagrado na conformidade da sua fé.
Cheguei aos setenta, e, como depositário
da fé, muito mais amadurecido,
experimentado e sofrido na esperança do meu amanhã atravessando o Mar Vermelho
da minha existência, e, me fortalecendo dia a dia na oração e na leitura da
minha bíblia. Já não conto faz muito tempo, o dia do amanhã, esse desconhecido
e improvável acontecimento. Aprendi a contar e vivenciar o meu hoje, meu
instante, meu presente. Não faço futurologia e nem esboço de dentro do meu coração
anseios de vida longa que eu não desejo, nem quero, nem almejo.
Cheguei aos setenta com a consciência
livre e encantada do dever cumprido, de ter sido um bom cidadão exemplar, um
bom pai depois de ter sido um bom filho. Criei filhos no temor do meu Senhor e
aprendi a contar os meus dias na presença do meu Senhor.
Cheguei aos setenta, cheio de orgulho
de ter evitado errar o máximo que eu podia e de ter contribuído, de alguma
forma, para o engrandecimento do ser humano ajudando e criando bons filhos e
bons cidadãos.
Por tudo digo: “solo gratia plena Dei”.
quinta-feira, 16 de junho de 2016
Caro Bertinho:
Sempre que revejo os DVDs da ONG – SERRA DA ITIÚBA, não
apenas lágrimas nos olhos me saltam e anuviam a vista. Penso muito na
possibilidade de vocês encamparem uma idéia muito interessante que seria o da
construção do MUSEU DE ITIÚBA.
Espaço existe como o da casa
da D. Bebé, proprietária da Fazenda Salgada que originou o Povoado e,
consequentemente, mais tarde, Arraial, Vila e Cidade.
O imóvel seria muito adequado
e, creio que o valor monetário, poderia ser bancado pela comunidade de Itiúba
via Prefeitura.
Só não podemos ficar à mercê
de prefeitos analfabetos e carreiristas, para os quais,a história para nada
serve, bem como não podemos depender de Câmaras de Vereadores preocupadas muito
mais em dilapidar, usufruir, enriquecer e garantir sobrevivência.
Para tal, sem que alguém comprometido com a
história e a cultura da nossa terra tome as rédeas, corre-se o risco de
desaparecer aquela casa já bastante estiolada sem a consecução desse plano e o
sonho de um museu de Itiúba desaparecer.
SAJesus 13/06/2016
Um abraço renovada a amizade
do Conterrâneo
Max.
sexta-feira, 10 de junho de 2016
MEUS CAROS MÉDICOS
Escrevo para dizer a vocês que
continuo aqui livre, leve e faceiro. Tive o discernimento de acordar do
pesadelo e recusar o desumano tratamento que vocês dão para as pessoas com
câncer. Em vez de submeter-me cego e doido, acordei e, simplesmente raciocinei:
médicos são seres frios e impessoais movidos por um dinariozinho que ninguém é
de ferro.
Calculei que minha largada do porto,
enfunadas as velas, amarradas as poitas, assestado o cabrestante e ajustada a
bússola na direção norte, deverá ocorrer dentro de uns quinze a vinte a dias, podendo até ultrapassar, que nada é
fatal neste mundo de projeções. Aí sim, deverei iniciar propriamente a
travessia do mar vermelho em direção à praia alva do outro lado, quando aportar
serenamente o meu navio.
Sei que não sentiram muita falta da
minha presença lá nos hospitais. Tampouco a sentirão. Afinal de contas
pacientes são só pacientes a experimentar, como cobaias, drogas sem comprovação
nenhuma cientifica, como meros e expectantes sobreviventes da sorte.
Estou feliz. Rio da minha vida, embora a
doença incomode e cause muito desconforto, pelas dores que são terríveis, não
obstante, o desconforto de um modo geral possa ser suportado.
Não tenho mágoa nem me lastimo de nada.
Muito pelo contrário, agradeço a Deus e sou um privilegiado. Mas tenho um
segredinho para dizer a vocês e não quero que as pessoa saibam, mas, para tal,
preciso falar baixinho aos seu ouvidos;
“Tenho
uma pressa retada de deixar essa vida”. Mantenham segredo.
quinta-feira, 9 de junho de 2016
RESTAURANTE E CINEMA DE ITIÚBA.
Morei em Itiúba a partir de 2005. Um dia parei
num restaurante com minha esposa. O horário era do meio-dia, hora de almoço.
Pedi certo refrigerante e o cardápio. Estava sentado dentro daquele prédio da
minha infância e adolescência, verdadeiro templo de saber e de conhecimento, de
diversão e de felicidade.
O antigo Cine Itiúba do Bertinho!!!
Minha esposa não deixou de ver minhas
lágrimas indisfarçáveis encherem os olhos. Falei para ela, descrevi sons e
telas, lugares e recantos como se estivesse menino retornando no tempo e
rompendo de volta o espaço na invisibilidade.
Falei de pessoas entrando e saindo,
em especial nos dias de domingo e sábado, dos meus olhos compridos e tristes,
na frente do cinema, de quando não tinha dinheiro para pagar o ingresso, das
películas, de artistas, de monstros sagrados que se foram de prefixos musicais,
de filmes e de tudo que povoou meu imaginário. Falei ainda das noites mágicas e
feéricas, de faiscantes lâmpadas, das tabuletas pintadas pelo Isnar, assim como falei do Macambira espalhando-as pelas esquinas
centrais.
Chegou a comida. Comi-a em silêncio. Partimos
A vida é um “partir” sem fim.
quarta-feira, 1 de junho de 2016
Sobre circos, rumbeiras e palhaços
Vejo com os olhos que a terra fria há de comê-los conforme
hiperbolicamente e pleonasticamente a língua me permite, dos sentidos aflorados
nas recordações, a grande lona de circo sendo montada por mãos calejadas e
frontes suadas. A azáfama, o corre corre desesperado para erguer o circo, os
carros coadjuvantes se organizando formando uma barreira ao derredor, e, pouco
a pouco, aquela estrutura se desenhar no mundo
ocupado pelo circo já erguido.
Já de tardinha, vejo o palhaço com
suas enormes pernas-de-pau, cara pintada com seu nariz vermelho- vivo e calças largas
e folgadas num esforço terrível para alcançar as próprias pernas. Vejo meninos
de calças curtas ao redor disputando um lugar para sair atrás do palhaço pela
cidade anunciando e repetindo aquele refrão velho e engraçado que não sai das
mentes dos meninos já adultos. Vejo menino com caras marcadas por cruzes feitas
nas testas de óleo e carvão para que não pudesse ser apagado, o cuidado em não
tomar banho para não lavar a cara, a mãe verberando que “você não precisa disso”,
e vejo meninos enfileirados para reclamar o direito de adentrar ao local, de
risos e felicidade, por terem gritado que o “palhaço era um ladrão de mulher” durante toda uma tarde.
Vejo rumbeiras lindas, sacudindo as
ancas febrilmente dançando mambos ao som de bandas anônimas, pernas e coxas
grossas e voluptuosas, olhares ávidos, homens de todas as idades com aqueles
olhares gananciosos e indisfarçados, quase despudorados, mulheres - esposas
absolutamente com as caras amuadas diante, e, na hora das rumbeiras, sublime instante
para os nossos pensamentos ainda que pueris na ausencia de poder.
Vejo o circo nos seus dramalhões
formidandos, em Três Atos, o riso e a felicidade, a alegria e os assobios
aprovadores. E, finalmente a tristeza de ver a lona ser deitada, transportados
todos os utensílios para os trens. Vejo as rumbeiras e trapezistas não tão
deslumbrantes em roupas comuns, correndo, carregando filhos e tralhas, para não
perderem a hora do embarque rumo a outras praças.
Vejo o quanto morremos neste existir
flegmático, nesse transe de dores, existências vividas e despedidas.
Assim eram os circos em Itiúba na
chegada e na despedida.
quinta-feira, 26 de maio de 2016
UMA QUADRILHA DA PESADA.
Quem não se escusa de ler um pouco o
que se passa no Brasil, descobre, estarrecido, o quanto o Brasil foi seriamente
assaltado e vilipendiado por homens que tomaram, ainda que pelo voto, a coisa
pública, transformando o país na pocilga mais abjeta e nojenta que se tem
noticia.
Podemos afirmar que uma quadrilha da
pesada, ou seja, uma quadrilha que aparelhou o Estado Brasileiro para servir
aos propósitos de políticos sem quaisquer escrúpulos, verdadeiros assaltantes a
se locupletar, na garantia da impunidade, do que pertence ao bem comum.
Estarrecidos, assistimos diariamente
o noticiário, a publicação em livros e revistas, enfim, em todos os meios de
comunicação, desatadas as correias e as correntes da proibição e sem o encanto
que elevou os bandidos do Planalto a flanarem desavergonhadamente e com
transito livre os cofres da nação.
Assaltando despudoradamente a nação, o
cinismo dessa gente conseguiu rebaixar o Brasil e suas instituições,
delinqüentes escondidos e escudados sob um pretenso “esquerdismo,” cujo objetivo consistia em enriquecer mais e mais
apaniguados, parentes e detentores de cargos, a mão cheia distribuídos,
transformando o exercício do mando em verdadeiras peripécias de bandidos e
delinqüentes muito mais cínicos e especializados na sangria que se verificou em
todos os níveis.
É de se notar que tão cedo a mácula
abatida sobre os brasileiros e à má fama daí advinda de sermos os mais
corruptos da face da terra, não será desmistificada se fosse mero e simples
mito, mas a realidade sensível e palpável.
Bate de frente aquela sensação de
esfaqueados e surrupiados por mandatários inescrupulosos, transformando a nação
em um templo obscuro onde a “seita
lulista” se locupleta e se espalha sobre sua fedentina para espalhar a
instabilidade e a descrença de um povo, solapando diuturnamente e lentamente o
sentido de nacionalidade, de amor à pátria, de decência em que as instituições
precariamente se sustentaram pelo aparelho formidando que a quadrilha de
deliquentes montou em desfavor dos brasileiros.
Resta-nos a esperança e o desespero de
recomeçar do zero, de remontar uma nação, e, de encontrar, e, de punir
severamente, os culpados; para que possamos voltar a respirar e a reensinar o
povo a dignidade e o caminho da seriedade no trato da coisa pública..
O “BURACO DA VOVÓ”!
Belos tempos aqueles em que “o buraco da vovó” era apenas uma
reentrancia encravada na rocha sólida, formando um paredão que se desenhava
contra os céus, nos sertões de Itiúba. Não aquela reentrância das vovós
modernosas se exibindo em calendários pseudos modernos em que as vovós que se
apresentam em trajes adâmicos, despudoradas, relapsas e absolutamente
envaidecidas pelos falsos elogios das suas pudendas partes, outrora chamada
íntimas, porém, secretas.
Refiro-me aqui e agora para os incautos
aqueles tempos em que existiam verdadeiros observadores do tempo, ensinados e
aprendidos, acostumados e calejados na prática diária e na observação,
desvendando fenômenos primários da natureza, tal o aproximar-se das chuvas e
das estações.
“Buraco
da vovó” era então, e digo “era”,
porque não sei se ainda as pessoas assim conhecem ou chamam, não passava de uma
reentrância na montanha de pedra bruta, na “Serra
do Encantado”, fazenda do senhor, hoje finadíssimo Ademir Simões, formando
uma concavidade aonde, pela abaulada pedra, ficava retida a nevoa por dias e
dias. Quando acontecia, era sinal, pelo menos para os sertanejos locais, de que
teríamos um ano de chuva e de muita fartura. A neblina trazia um pouco de frio
e quedas na temperatura, e os olhares de todos para lá se dirigiam para ver
aquele mundo de brancura se desprendendo lentamente na medida em que o sol
lançava sobre o buraco seus raios.
Era um espetáculo de simplicidade. Fugaz,
desaparecia demorando-se poucos dias. O “Riacho
da Grota” se enchia, lambaris subiam e desciam na sua temporalidade pelo
pasto do Valadares e os meninos acorriam para apanhar pequenos peixinhos
SAVEIROS DA BAHIA
O ano está cravado e gravado na mente.
Era 1957. Chegado dos sertões, o garoto possuía 11 anos de idade e fora trazido
com dois intuitos: Conhecer salvador, e os familiares do seu pai.
A casa era da Tia
Cilu, irmã do meu pai, Joaquim
Brandão Cirne, e fica no outrora
aprazível e poético Largo da Ribeira, onde joguei peladas, corri da polícia
chamada de Cosme e Damião, de portada oficialmente, chamada Praça General Justo .
Ali o atônito menino sertanejo encontrou, pela primeira vez, mas não a última,
a imensidão do mar debruçado na Ribeira e o vai-e-vem dos barcos e saveiros que
chegavam trazendo telhas, peixes, farinha, tijolos, areia, cerâmicas de todas
as espécies, enfim de tudo quanto aquelas soberbas embarcações podiam
transportar. Resumindo: tudo quanto se possa imaginar. O Recôncavo, essa parte
que praticamente só existe na Bahia, não conhecia estradas, nem as possuía, nem
tinha asfalto, enquanto a Bahia se despontara como grande pólo
desenvolvimentista a partir dos anos “50”.
Aprendi que se chamavam “saveiristas” aqueles mulatos
fortes e espadaudos que conduziam aquelas grande embarcações. Todos os dias fiz
hábito em ir para o pequeno porto da Ribeira aguardar aqueles homens que
traziam de tudo e a li descarregavam afoitamente, retornando aos seu lugares.
Nunca fiz amizades com nenhum deles. Os mestres saveiristas como eram
conhecidos soçobraram e sucumbiram ao progresso. Hoje a Bahia de todos os
Santos quase não permite mais a visão de um saveiro, salvo e rara exceções. O
tempo se encarregou e, talvez e certamente o progresso, de afogar e fazer desaparecer
aqueles barcos formidáveis que singravam e desafiavam mares e ventos.
Viajei, em outros tempos, quando já
adulto e voltei para Salvador em pequenas viagens de saveiros entre a Ilha de
Itaparica, Mar Grande e Salvador. Mas nada que se possa comparar ao período dos
saveiros da Bahia.
O HOMEM DA PEDERNEIRA.
Não me recordo exatamente o ano. Acho
que foi lá pelo ano de 1960. Sei que já se esfumou no tempo e no espaço. Era eu
um garoto tomando conta da “venda”,
assim era chamado o armazém de secos e molhados dos meus pais, lá nos sertões
da Bahia, numa cidade chamada Itiúba.
De repente entra no estabelecimento um
homem de meia idade, vestindo uma capa colonial, chape de feltro e botas
caipiras. Aproximou-se e pediu uma jurubeba leão do norte. Servi-o enquanto ele
sorveu-a com sofreguidão e sede. Pagou. Parou e retirou do bolso um charuto e
um instrumento rudimentar acondicionado num pequeno pedaço de chifre de animal.
Lembro-me de que tinha no fundo do
instrumento um algodão amarelo e encardido, chamuscado e bastante usado. Aquele
homem apanhou no mesmo bolso dois pedaços de seixos rolados e começo a bater um
no outro poucas vezes. Tinha ele muita prática, e, assim, de repente, a faísca inflamou
o chumaço pequeno de algodão. Ele soprou rapidamente e fez-se fogo. Acendeu o
charuto. Pagou a bebida, agradeceu-me, despediu-se e desapareceu na bruma do
meu tempo.
Jamais o esqueci. Parecia saído da
idade da pedra lascada. Bizarro, aquele senhor deixou-me a impressão de estar vivendo
dentro de um mundo seu, o qual se apegara e não conseguia emergir. Podia
pedir-me uma caixa de fósforos, acender seu charuto e devolver-me, ou
simplesmente podia comprar uma. Não o fez. O homem da pedra lascada, ou polida,
ou nas trevas do seu tempo particularizado deixou-me uma déia do quanto o homem pode adaptar-se e permanecer
independente da sociedade e do progresso da ciencia.
Nunca mais o vi. Era um forasteiro. Ou
uma mera ficção da vida!!!
Assombração, não foi!
quarta-feira, 20 de abril de 2016
KRONOS versus THANATOS
Já foi dito que o homem pode tudo. Já foi cantado e decantado o poder
que o homem pensa ser e ter. Já foi dito que o homem pode vencer tudo.
Não pode!
Apenas e tão apenas somos estuários de situações pré existentes ao
homem. Não se pode dominar nem exercer nenhum poder sobre aquilo que
não fabricamos consequentemente não se tira poder de onde não fora dado.
Quando o homem, enquanto ser, se debruça sobre a existência e tudo
quanto dela advém, sobra-nos um entendimento no sentido da nossa total e
abissal incapacidade de gerir seus efeitos, prever ou até mesmo suportar.
Vamos aqui e agora nos referir ao que os gregos na sua sabiedade e
perquirição sobre o “desconhecido” legaram ao mundo através da filosofia, da
inquirição, dos questionamentos, da razão e da profundidade levando-os ao
reconhecimento das limitações do homem.
Queremos fazer referencia ao deus “Kronos” que vem a ser o “deus do
tempo” em que o homem se antecipa na sua incapacidade de prever o instante
seguinte, não tem sobre ele o mínimo poder, se distancia na sua incapacidade
de antever e prever fatos e acontecimentos. Quando ele menos nota esse
inexorável lapso, já se distanciou. O ontem é apenas um passado esvaido,
enquanto o desvendar do amanhã é uma conjectura jamais alcançada
compreendida ou até mesmo percebida.
Kronos é o tempo, seus complexos e suas exatidões, embora o homem
permaneça extático e imbuído de poderes que pensa tê-los, porém,
absolutamente inservíveis para entrar na sua soberania sobre os mortais. A
cronologia que é nada mais nada menos que a idade medida e estudada,
passa a ser para o “ser” o que virá e nunca o pretérito.
Do outro lado no mesmo Panteon dos deuses gregos tão fartamente
criados e exaltados por eles, desponta na sua magnífica mitologia, a maior
delas sendo, possivelmente, aquela a quem mais se devotavam que era o
reconhecimento de “Thanatos” personificação da propria inexorabilidade da
morte. Dedicando seus mais aprofundados questionamentos sobre o fenômeno
morte, os gregos legaram ao mundo idéias que pensavam aprofundadas, com
suas consequencias descrevendo formas e modos de morrer, mas ao mesmo
tempo dedicando total e obsequioso desprezo sobre ela, uma vez que
reconheciam sua inexorabilidade e sua exequibilidade.
Os gregos dessa forma se esteavam na inexequibilidade mortal para, até
certo ponto, criar nas suas mentes, tanto idéias quanto conceitos, chegando ao
desprezo e pouco apreço pela propria vida.
Reconheciam desse modo o que eles mesmos chamavam de
“Methanóia” que vem a ser a incapacidade de qualquer arrependimento,
imbuídos de outro verbo que ao mesmo tempo é adjetivo “Methanuel”. Assim, o
arrependimento para os gregos soava como uma incapacidade de voltar atrás
mas reconhecer, assim como as idéias do “demiurgo” a não repetição dos fatos
ocorridos, não permitindo nem admitindo nenhum mudança em que o ápice das
suas concepções no reconhecimento de que o “homem não pode mudar as
coisas”.
Não foi à toa o nascimento e surgimento das mais variadas correntes de
pensadores, a despeito dos “estoicos” que pregavam e ensinavam o
desprendimento e a capacidade do homem suportar as dores e os reveses da
vida. Nas cidades-estados, em especial Atenas e Esparta, a criança aprendia
desde a infância o ônus das dores e aflições morais, físicas e espirituais, uma
vez que eram entregues ao Estado, aprendendo e sendo disciplinados a
suportar dores e a morte sem reclamar, ao contrario de outras correntes como
a dos “Cínicos” encabeçada por Epicuro que ensinava que se devia “comer e
beber, uma vez que amanha morreremos”.
Oxalá pudéssemos beber, ainda que, de vez em quando, alguns desses
conceitos. Mas que eles estão aí não se discute.
Seja como for, tanto a morte que é Thanatos, quanto o tempo que é
Kronos aí estão no nosso dia, desafiando os homens a mudá-los ou a
influenciar sobre qualquer deles.
Não pode!
segunda-feira, 18 de abril de 2016
BRASIL EM EBULIÇÃO
Ontem dia 17 de abril do ano de dois
mil e dezesseis, o Brasil assistiu a mais um espetáculo altamente depravado,
ensejado pelos políticos da Câmara de Deputados Federais.
Atravessa o Brasil historicamente uma das suas
piores quadras da vida como se Brasília, a sede governamental e administrativa
deste país fosse uma vestal ilha carregada de sonhos distanciados da sua
população empobrecida e ignorante que vive nas cidades e grotões desafiando
homens que não aparecem e que possam não apenas ostentar o título de
“estadistas” em vez de “oportunistas”, para retirar as populações desse antro
de penúrias e sofrimentos atrozes.
Reunidos com o intuito de aprovar um
relatorio em que pedem o “Impeachment” da presidente da república, as
manifestações do povo sofrido aparentemente foram notadas e sentidas, enquanto
uma turba absolutamente ignara e incipiente nos princípios políticos e nas leis
regenciais do país se debruça entre o fanatismo louco e a imbecilizada ação de
grupos, dos que se denominam “mortadelas”
versus “coxinhas”, permitindo o
paroxismo e o alardear de fulgurantes trajetórias que não chegam a alcançar o
povo letrado.
Inegavel que mentes mais arejadas e distanciadas
do redemoinho e dos reboliços do Planalto, conseguem, até mesmo com certa
facilidade, estabelecer parâmetros e medidas, distanciadas dos reais interesses
e das jogadas que são feitas, tendo sempre como pano de fundo e destinatário as
turbas nervosas sempre do lado de fora dos ambientes e dos recintos pouco
iluminados aonde os destino da nação são traçados, e, repartidos como butim,
assim distribuídos entre os “ratos do poder”.
A insipiencia do povo brasileiro em
materia política, o distanciamento das questões mais prementes, mas que
refletem diretamente nas vidas de cada cidadão, não parecem ser notadas nem
sentidas diante de festas promovidas, de campos de futebol os mais suntuosos e
extravagantes, o analfabetismo e a ausencia de leitura dos cidadãos a não apropriação dos conceitos do que seja
cidadão, tampouco cidadania, muito menos os direitos mais básicos de uma
sociedade.
Não que qualquer cidadão da mais
mediana capacidade não tenha sentido que o Brasil atravessa na incompetência da
sua presidenta, uma demonstração mais que cabal da sua total insipiência e
absoluta ausencia de um norte, na crônica incapacidade de gerir a coisa púbica,
antipatizada e rejeitada pelas turbas muito mais representadas em poucas
pessoas, ainda capazes de auscultar os anseios do Brasil e compreender suas
mazelas.
Bom seria que todo aquele espetáculo
midiático fosse só um pesadelo passageiro com aquele das noites indormidas e
sofridas, mas, como todo carnaval, o Brasil, acordará na manhã de quarta feira
de cinzas, cabeça inchada, ventre doendo e ressaca terrível.
“Qvo vadis”?Pobre e isolado Brasil!!!
quinta-feira, 7 de abril de 2016
BRASIL – um país desnorteado.
Seguramente o Brasil não é, nessa quadra da vida, um dos melhores para
se viver. Mergulhado numa crise incalculável e de proporções desconhecidas e
não mensuradas na sua verdadeira extensão, o Brasil se debate entre crises
terríveis incapacitando-o para a desmoralização mundial, transpostas as
fronteiras da legalidade e alcançando as raias do absurdo e da ausência total
de parâmetros aceitáveis e decentes, quando seus homens públicos derrocam
a ética em meio a vendavais extensos e infindáveis de conspiração para a sua
destruição.
Não seria capaz ao menos de estabelecer a extensão da crise por que
passamos, embora brasileiros tentem explicar o funcionamento das
instituições, aparentemente intocáveis e não alcançadas.
Francamente não é o que se vislumbra quando os Três Poderes
Republicanos se engalfinham em disputas açambarcando os poderes
invadindo competências e as esferas uns dos outros numa inversão de
significados. A atuação da Suprema Corte de Justiça o Brasil, inominável e
lamentavelmente se apartidarizou vergonhosamente buscando e intrometendose
sem pudores, via ministros isolados ou em conluio direcionado para atingir
membros de outros poderes a despeito do senhor presidente da Câmara de
Deputado senhor Eduardo Cunha apontado como beneficiário de corrupções e
com contas fora do país.
De outro lado as suspeitas de abafamento de uma atuação do senhor juiz
Sergio Moro através da Lava-Jato parece ter descoberto a pólvora e
estabelecido o parâmetro para apurar as corrupções dos que procuram abafá-
la e até apagá-la, exatamente aquela que ainda, por incrível que pareça, se
apresenta como exemplo de honradez e esperança para milhões de brasileiros
que ainda acreditam na justiça ou o que, dos seus farrapos ainda resta.
O senhor presidente do senado mergulhado em denuncias as mais serias
aponta Renan Calheiros como um dos mais corruptos do panorama nacional.
Precisamos crer e esperar mais um pouco enquanto a panela não
explode lançando no ar da perigosidade sonhos e aspirações acaso
desdenhados. Mudanças.
terça-feira, 22 de março de 2016
UM PAÍS EM SANGRAMENTO LENTO
Os brasileiros de mediano entendimento, sofrem no acompanhamento da
agonia lenta do país. Dominado por um partido político dito de esquerda, não
refletiu os anseios das populações, nem conseguiu se libertar dos parâmetros
de outros governos, antes duramente criticados, avançando para um
liberalismo em que o capital se agiganta em concentração jamais vista nas
mãos de poucos empresários, enquanto o grosso populacional míngua no
desemprego e na ausência de perspectivas desesperadoras.
O Brasil experimenta nessa sua atual quadra de existência, uma das
maiores farsas com aparência governamental, assim considerado pelas
massas, nas ruas, que pedem inexoravelmente a renúncia de uma presidente
que se arvora em ser a” mãe de todos” esbaldando, de afogadilho, soluções
que fenecem dia a dia.
Na dança de cadeiras, põe ministros, retira ministros, negocia cargos,
compra consciências, enquanto tenta, no desespero de uma rejeição
governamental de 69% das populações, ressuscitar do seu obituário, usando o
gigantesco, porém insustentável e pouco ineficaz aparato, diante do repúdio
das massas ao seu nome e ao seu governo.
A senhora Dilma que sofre ataques e acusações de má administração e de
incompetência gerencial, se arvora e se agarra, desesperadamente nas
massas pobres, quer entregando casas do seu, ao que parece único programa
que é o “Minha Casa, minha vida”, pobre e simples função burocrática,
deslustrosa para uma presidente, incapaz de auto criticar-se, mas não sabe
delegar a um ministro ou até mesmo um secretário subalterno preferindo ela
mesma, a função de entregadora de chaves das pequenas casas.
Chamada pelos desafetos de “fantasma”, “demente” e outros adjetivos da
criação popular, é atacada e vista como a inimiga pública nº 1. Parece que ao
pinçar soluções empurradas pelos seus companheiros de governo e de partido,
se rejeita e se afunda cada vez mais, e se credencia ao lixo da história, uma
vez que não é capaz de debelar a formidanda rejeição ao seu nome, criando
neologismos apropriados e epítetos que a desmascaram enquanto o país
perigosamente se vestiu de um manto de ira e de agravo.
Enquanto o tormento toma conta de todo um país perplexo e parado, a
sangria econômica se agiganta, o desemprego campeia, o mundo se volta com
estupefação para dentro de nós, a fome e sede de poderes e o egoísmo, a
prepotência e a arrogância, parecem se fortalecer cada vez mais, naqueles que
deveriam, num rasgo de estadistas, o que falta aos brasileiros atualmente, se
desgarrar dos seus projetos pessoais de poder, cedendo, destarte, ao outro, a
condução dessa nau perigosamente singrando mares encapelados.
E ela apropriada dos palácios suntuosos, sustentados pelos sofridos
brasileiros, continua sustentada sua megalomania por nós, calmamente e
placidamente a pedalar suas bicicletas importadas, a levantar vôos indefinidos
para alcançar o nada, visitando parentes e amigos, gastando querosene de
aviação, dinheiro público, infernizando com seu parasitismo crônico a vida dos
brasileiros quase enlouquecidos, e, a beira de um verdadeiro ataque de nervos
diante de tanta insensibilidade e arrogância da senhora Dilma, deixando as
oportunidades se esvaírem sem soluções, por ela, repudiadas golpistas, contra
a nação.
Até quando suportará o povo tanta desdita?
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